TL;DR: A Vogue legitimou o uso de modelos gerados por IA ao aprovar um anúncio da Guess, sinalizando uma transformação irreversível na indústria da moda. Embora controversa, a tecnologia está sendo rapidamente adotada por marcas devido aos menores custos e maior escalabilidade, ameaçando principalmente modelos de e-commerce que dependem dessa área para sustento financeiro. O futuro será provavelmente híbrido, com IA dominando campanhas de volume enquanto modelos humanos mantêm relevância em segmentos que valorizam autenticidade.
Takeaways:
- O engajamento positivo com modelos de IA supera as críticas em 20 vezes, com taxa de cliques 30 vezes maior que reclamações
- E-commerce é onde modelos mais ganham dinheiro e onde a IA representa maior ameaça, não em campanhas de alta visibilidade
- Marcas precisam produzir centenas de milhares de conteúdos versus quatro campanhas anuais do passado, tornando a IA economicamente necessária
- Modelos podem sobreviver construindo marca pessoal, diversificando receitas e explorando suas histórias humanas únicas
- A aprovação da Vogue legitimou modelos virtuais da mesma forma que fez com Kim Kardashian, tornando a prática mainstream
Inteligência Artificial na Moda: Como Modelos Virtuais Estão Revolucionando a Indústria e Ameaçando Carreiras
A indústria da moda vive um momento decisivo. Quando a Vogue, uma das publicações mais influentes do mundo fashion, aprovou um anúncio da Guess com uma modelo gerada por inteligência artificial, ela não apenas endossou uma tecnologia emergente – ela sinalizou uma transformação irreversível.
O que começou como uma experiência controversa da Levi’s em 2023, usando IA para “aumentar a diversidade”, agora ganhou o selo de aprovação da alta moda. Mas essa revolução digital traz consigo questões profundas sobre o futuro do trabalho, autenticidade e diversidade real na indústria.
A Controvérsia que Mudou Tudo: Vogue Abraça a IA
Em julho de 2025, a Vogue publicou um anúncio da Guess apresentando uma modelo loira de olhos azuis e características impecáveis. O detalhe? Ela não existe.
A reação foi imediata e polarizada. Enquanto críticos questionavam os padrões de beleza artificiais e o futuro dos modelos humanos, os dados contavam outra história. Segundo PJ Pereira, cofundador da Silverside AI:
“Se você olhar além dos comentários, verá que há uma maioria silenciosa – quase 20 vezes mais engajamento – que supera vastamente as críticas. A taxa de cliques foi 30 vezes maior que o número de reclamações, e o produto teve um aumento acentuado nas vendas.”
Esta controvérsia revelou uma verdade incômoda: por mais que alguns rejeitem modelos de IA, o mercado consumidor parece estar pronto para aceitá-los.
O Impacto Real nos Modelos de E-commerce
Enquanto o debate público se concentra em campanhas de alta visibilidade, a verdadeira revolução está acontecendo nos bastidores do e-commerce. Sinead Bovell, fundadora da WAYE, é direta sobre onde a ameaça é mais real:
“E-commerce é onde a maioria dos modelos ganha seu sustento. Não é necessariamente o caminho para a fama ou prestígio, mas é o caminho para a segurança financeira.”
Sarah Murray, modelo comercial, expressa a preocupação de muitos profissionais:
“A modelagem como profissão já é desafiadora o suficiente sem ter que competir com novos padrões digitais de perfeição que podem ser alcançados com IA.”
A tecnologia atual permite que marcas substituam completamente sessões de fotos tradicionais. Paul Mouginot, tecnólogo de arte, explica:
“A IA agora permite começar com uma foto de produto simples, colocá-lo em um modelo virtual fotorrealista e até posicionar esse modelo em um cenário coerente, produzindo imagens que parecem editoriais de moda genuínos.”
A Matemática Implacável: Por Que Marcas Escolhem IA
A adoção de modelos virtuais não é apenas uma questão de inovação – é uma necessidade econômica. Amy Odell, escritora de moda, resume a realidade:
“É muito mais barato para as marcas usar modelos de IA agora. As marcas precisam de muito conteúdo, e isso se acumula. Então, se elas podem economizar dinheiro em seu anúncio impresso ou feed do TikTok, elas farão.”
Os números são impressionantes. Onde antes uma marca precisava de quatro grandes campanhas por ano, agora precisa de centenas de milhares de peças de conteúdo para redes sociais e e-commerce.
PJ Pereira explica a mudança fundamental:
“Não há como escalar de quatro para 400 ou 400.000 apenas com ajustes de processo. Você precisa de um novo sistema. As pessoas ficam bravas. Elas assumem que isso é sobre tirar dinheiro de artistas e modelos. Mas não é isso que eu tenho visto.”
Benefícios da IA para Marcas:
- Redução de custos: Elimina gastos com modelos, fotógrafos, stylists e locações
- Escalabilidade: Produção de milhares de imagens em tempo recorde
- Flexibilidade: Mudanças instantâneas sem nova sessão de fotos
- Consistência: Padrão visual uniforme em todas as peças
O Dilema da Diversidade Artificial
Uma das críticas mais contundentes ao uso de IA na moda é o conceito que Sinead Bovell chama de “apropriação cultural robótica”:
“Usar IA para gerar certas identidades para contar histórias de marca, mesmo quando os criadores da tecnologia não pertencem ao mesmo grupo.”
O caso da Levi’s ilustra perfeitamente essa tensão. A marca anunciou que usaria IA para “aumentar a diversidade”, mas Sarah Murray rebateu:
“Há muitos modelos diversos ansiosos por trabalhar com essas marcas.”
A questão central é: se uma marca pode gerar digitalmente qualquer tipo de diversidade, ela realmente está apoiando a inclusão ou apenas simulando-a?
Protegendo os Direitos dos Modelos na Era Digital
Reconhecendo os riscos, profissionais da indústria estão se mobilizando. Sara Ziff, fundadora da Model Alliance, trabalha para aprovar a Fashion Workers Act, que exigiria que marcas:
- Obtenham consentimento explícito dos modelos
- Forneçam compensação pelo uso de réplicas digitais
- Garantam transparência sobre o uso de IA
Paul Mouginot vê potencial para um modelo híbrido:
“Permitir que modelos apareçam em várias sessões de fotos no mesmo dia através de avatares poderia gerar renda adicional.”
Mas isso levanta uma questão filosófica: se um avatar pode substituir a presença física de um modelo, qual é o valor real do trabalho humano?
Como Modelos Podem Sobreviver à Revolução da IA
Para modelos que querem se manter relevantes, Sinead Bovell oferece conselhos práticos:
“Comece a aproveitar essas oportunidades para contar sua história humana única. A IA nunca terá uma história humana única.”
Estratégias de Sobrevivência:
- Construir marca pessoal: Desenvolver presença digital própria
- Diversificar receitas: Explorar podcasting, parcerias, produtos próprios
- Especializar-se: Focar em nichos que valorizam autenticidade
- Adaptar-se continuamente: Aprender novas habilidades e tecnologias
A mudança para o aprendizado autodirigido é fundamental. Como observa Bovell, profissionais que conseguem se adaptar e aprender continuamente estarão bem posicionados para prosperar.
A Importância da Imperfeição Humana
Apesar dos avanços tecnológicos, há algo insubstituível na humanidade. Paul Mouginot observa:
“Muitos modelos revolucionários devem seu sucesso precisamente a uma característica distintiva – dentes, olhar, atitude – que é ligeiramente imperfeita pelos padrões rígidos, mas absolutamente encantadora. Essas nuances são difíceis de capturar em zeros e uns.”
Sandrine Decorde, CEO da Artcare, trabalha para incorporar essa humanidade na IA:
“É como costurar; é muito delicado. Quanto mais tempo gastamos em nossos conjuntos de dados e refinamentos de imagem, melhores e mais consistentes nossos modelos são.”
O Problema da Homogeneização
Um desafio significativo dos modelos de IA é sua tendência à perfeição homogênea. PJ Pereira alerta:
“Assim como você faria casting para uma ampla gama de modelos, você precisa criar prompts para isso. Você precisa treinar modelos com uma ampla gama de aparências. Porque se não fizer isso, a IA refletirá quaisquer vieses com os quais foi treinada.”
A responsabilidade recai sobre as marcas para garantir que a diversidade artificial seja genuinamente representativa, não apenas esteticamente conveniente.
Diferentes Abordagens das Marcas
O mercado está se dividindo em três estratégias principais:
- Modelos totalmente artificiais: Criações digitais do zero
- Licenciamento de semelhanças: Usar réplicas de pessoas reais
- Resistência à tecnologia: Manter apenas modelos humanos
PJ Pereira observa:
“Algumas marcas se sentem bem usando modelos totalmente artificiais. Outras preferem começar com pessoas reais e licenciar sua semelhança para construir sessões sintéticas. E algumas marcas simplesmente não querem fazer isso – elas temem que seus públicos não aceitem.”
O Futuro da Autenticidade na Moda
Claudia Wagner, fundadora da Ubooker, oferece uma perspectiva equilibrada:
“O talento humano permanece central, especialmente quando autenticidade e identidade fazem parte da história de uma marca.”
Amy Odell destaca o poder de validação da Vogue:
“O que a Vogue faz importa. Se a Vogue acabar fazendo editoriais com modelos de IA, acho que isso vai tornar isso aceitável. Da mesma forma que a indústria resistiu muito a Kim Kardashian e depois a Vogue a apresentou. Então ficou tudo bem.”
Conclusão: Navegando a Nova Realidade da Moda
A revolução da IA na moda não é mais uma possibilidade futura – é a realidade atual. Com a Vogue legitimando modelos virtuais, a indústria cruzou um ponto de não retorno.
Para modelos humanos, a sobrevivência depende de adaptação, diferenciação e construção de valor único. Para marcas, o desafio é equilibrar eficiência econômica com responsabilidade social e autenticidade.
O futuro provavelmente será híbrido: IA dominando o e-commerce e campanhas de volume, enquanto modelos humanos mantêm relevância em segmentos premium e campanhas que valorizam storytelling autêntico.
A pergunta não é mais se a IA transformará a moda, mas como profissionais e marcas se adaptarão a essa nova realidade. Aqueles que abraçarem a mudança, protegerem seus direitos e encontrarem formas de agregar valor humano único estarão bem posicionados para prosperar.
Como você vê o futuro da sua carreira ou marca neste novo cenário? O momento de agir é agora.
Fonte: Davis, Dominic-Madori. “The uproar over Vogue’s AI-generated ad isn’t just about fashion”. TechCrunch. Disponível em: https://techcrunch.com/2025/08/03/the-uproar-over-vogues-ai-generated-ad-isnt-just-about-fashion/