Novo Rascunho do Código da EU AI Act: Impactos e Diretrizes

União Europeia publica terceiro rascunho do Código de Prática para modelos de IA de Propósito Geral

O terceiro rascunho do Código de Prática voltado para provedores de modelos de Inteligência Artificial de Propósito Geral (GPAI) foi publicado na última terça-feira pela União Europeia. O documento visa auxiliar as empresas do setor a cumprirem as exigências da EU AI Act, esclarecendo obrigações legais e prevenindo possíveis sanções, que podem chegar até 3% da receita global anual das companhias em casos de descumprimento.

Este terceiro rascunho, considerado a versão final antes da implementação definitiva, está aberto para comentários públicos até o dia 30 de março de 2025. A iniciativa faz parte de um esforço contínuo iniciado no ano anterior para desenvolver diretrizes eficazes e claras, garantindo que as empresas compreendam plenamente suas responsabilidades.

Para facilitar o acesso às informações contidas no Código, foi lançado um website específico, permitindo maior transparência e acessibilidade ao documento. A expectativa é que essas medidas possam assegurar um cumprimento mais eficaz e uniforme das obrigações legais impostas pelo AI Act.

Estrutura simplificada visa maior clareza e coerência

A revisão mais recente do Código apresenta uma estrutura simplificada, com compromissos e medidas refinadas após intensa discussão técnica em grupos de trabalho e workshops. Especialistas esperam que essas modificações tragam maior clareza e coerência ao documento final, favorecendo a compreensão e a conformidade por parte dos provedores de IA.

Entre as novidades, destacam-se seções específicas sobre compromissos gerais para GPAIs, orientações detalhadas sobre medidas relacionadas à transparência e direitos autorais, além de obrigações específicas de segurança para os modelos mais poderosos, conhecidos como GPAISR. Tais seções buscam oferecer orientações práticas para facilitar a implementação das normas.

Um exemplo prático incluído no rascunho é um formulário detalhado de documentação dos modelos de IA, que deverá ser preenchido pelos provedores para garantir que os implementadores posteriores tenham acesso às informações cruciais de conformidade. Entretanto, a questão dos direitos autorais permanece controversa, com debates intensos especialmente entre as grandes empresas de IA.

Flexibilidade nas medidas de transparência preocupa especialistas

A atual redação do Código utiliza termos interpretativos como “melhores esforços”, “medidas razoáveis” e “medidas apropriadas”, o que pode permitir que grandes empresas de IA continuem coletando informações protegidas por direitos autorais para treinar seus modelos, dependendo de aprovações posteriores. Essa linguagem mediada levanta preocupações sobre possíveis brechas de interpretação.

Uma versão anterior do Código exigia explicitamente que os provedores de IA disponibilizassem um ponto único de contato para atender rapidamente a reclamações de detentores de direitos autorais. Essa exigência foi removida na versão atual, enfraquecendo a posição dos titulares de direitos ao lidar diretamente com as empresas.

Além disso, o texto atual oferece aos provedores de IA a possibilidade de recusar o tratamento de reclamações sobre direitos autorais consideradas infundadas ou excessivamente repetitivas. Especialistas alertam que essa postura pode resultar em desafios legais adicionais e disputas prolongadas entre empresas e detentores de direitos.

Requisitos de segurança restritos a modelos mais poderosos

Os requisitos do EU AI Act para avaliar e mitigar riscos sistêmicos permanecem aplicáveis apenas para modelos treinados com poder computacional significativo, especificamente aqueles que ultrapassam 10^25 operações de ponto flutuante (FLOPs). Em resposta a feedbacks recebidos, o terceiro rascunho restringiu ainda mais as medidas recomendadas para essa categoria de IA.

Essa redução nas exigências foi resultado direto dos debates técnicos ocorridos após as versões anteriores, indicando uma tentativa de equilíbrio entre segurança e viabilidade técnica. A expectativa é que as recomendações finais sejam realistas e praticáveis, facilitando a adesão das empresas sem comprometer a segurança e a integridade dos sistemas.

No entanto, esse estreitamento das exigências gerou críticas de analistas preocupados com a eventual diminuição da eficácia das medidas de segurança. O debate em torno desses ajustes técnicos permanece aberto e deve continuar influenciando a versão definitiva do Código.

Pressão dos EUA influencia posicionamento europeu sobre IA

A legislação europeia para regulamentar a IA tem enfrentado críticas severas por parte da administração dos Estados Unidos, liderada pelo presidente Donald Trump. Em diversas ocasiões, representantes norte-americanos alertaram que uma regulamentação excessiva pode limitar a inovação tecnológica, pressionando a União Europeia para flexibilizar suas normas.

Em um evento recente, o vice-presidente dos EUA, JD Vance, questionou abertamente a necessidade de regulamentação da IA, afirmando que medidas rígidas poderiam prejudicar significativamente o avanço tecnológico e econômico. Essas críticas têm gerado um impacto considerável nos debates internos da União Europeia.

Em resposta a essas pressões, a União Europeia já abandonou uma proposta anterior, conhecida como AI Liability Directive, num movimento interpretado como um esforço para tornar o ambiente regulatório mais competitivo e menos burocrático. Essa tendência pode influenciar fortemente a direção final do Código.

Empresa francesa Mistral enfrenta desafios técnicos de conformidade

Uma das vozes mais críticas contra o EU AI Act tem sido a empresa francesa Mistral, especializada em modelos GPAI. Arthur Mensh, fundador da empresa, afirmou que existem dificuldades práticas significativas para cumprir certas exigências técnicas previstas no Código, indicando desafios reais enfrentados pela indústria ao tentar adequar-se às novas normas.

Apesar das críticas, a Mistral declarou estar trabalhando em colaboração direta com reguladores europeus para superar esses obstáculos técnicos. O objetivo é encontrar soluções práticas que permitam a conformidade sem prejudicar a viabilidade técnica e econômica dos produtos da empresa.

Essa situação da Mistral ilustra claramente o dilema enfrentado por muitas empresas de IA na Europa: equilibrar a conformidade regulatória com a inovação tecnológica. O resultado dessas colaborações pode se tornar um exemplo importante para outras empresas enfrentando desafios semelhantes.

Comissão Europeia prepara orientações adicionais para esclarecer regras

Paralelamente ao desenvolvimento do Código de Prática, a Comissão Europeia está produzindo orientações adicionais por meio do AI Office, órgão responsável pela supervisão da aplicação da legislação. Essas orientações pretendem esclarecer definições-chave relacionadas aos modelos GPAI e suas responsabilidades específicas.

Tais esclarecimentos são considerados essenciais para garantir a implementação eficaz e uniforme das regras previstas no AI Act. Além disso, essas orientações poderão oferecer uma alternativa estratégica para responder às pressões dos Estados Unidos pela desregulamentação e flexibilização das normas europeias.

A expectativa é que essas orientações adicionais forneçam aos legisladores europeus ferramentas mais claras e objetivas para lidar com as críticas externas e internas, garantindo que o ambiente regulatório europeu continue equilibrado entre segurança, direitos autorais e competitividade econômica.

Próximos passos definirão cenário regulatório global para IA

O terceiro rascunho do Código de Prática do EU AI Act demonstra claramente o esforço europeu em equilibrar a necessidade de regulamentação rigorosa da IA com a promoção contínua de inovação tecnológica e competitividade econômica. No entanto, desafios significativos ainda precisam ser superados antes da implementação final.

As críticas internacionais, especialmente dos Estados Unidos, e as dificuldades técnicas relatadas por empresas como a Mistral, indicam que o debate sobre o futuro regulatório da IA está longe de ser finalizado. Essas questões terão um impacto direto na configuração definitiva do Código e nas práticas adotadas pelas empresas.

Por fim, as orientações complementares da Comissão Europeia podem desempenhar um papel crucial na resolução dessas questões pendentes. A forma como a Europa abordará esses desafios nos próximos meses provavelmente influenciará não apenas a regulamentação regional, mas também o cenário global da inteligência artificial.

Fonte: TechCrunch. “EU AI Act: Latest draft code for AI model makers tiptoes towards gentler guidance for big AI”. Disponível em: [https://techcrunch.com/2025/03/11/eu-ai-act-latest-draft-code-for-ai-model-makers-tiptoes-towards-gentler-guidance-for-big-ai/]

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